30.8.15

Faça Meu Jogo - Prólogo


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Dia de Colombo – 12 de outubro

– SABE QUAL é o seu problema?

Joe Campbell sequer olhou para cima quando a porta de seu escritório foi aberta, e a voz familiar de sua tia-avó mandona e extremamente intrometida invadiu a calma manhã de outubro que havia sido relativamente tranquila até então. Porque aquela era uma pergunta um tanto capciosa.

Hum. Problema? Que problema? Ele tinha um problema?

Ser forçado a aceitar um emprego para o qual não estava pronto, não tinha planejado, sequer desejava? Isso meio que era um problema.

Ser empurrado para o tal cargo porque seu pai havia morrido inesperadamente, com apenas 55 anos? Além de ser uma tragédia completa, certamente era um problema.

Lutar contra concorrentes que tinha imaginado que o consideravam um bobalhão quando ele entrara em cena para administrar uma grande cervejaria aos seus 20 e poucos anos? Problema.

Lidar com funcionários de longa data que não gostaram das mudanças que ele estava implementando no negócio da família? Problema.

Terminar um relacionamento porque a mulher não tinha gostado que ele, um sujeito hedonista, agora tivesse tantas responsabilidades? Problema.

Caminhar na corda bamba com os membros da família que passaram de lhe implorar para manter tudo do jeito que estava, e se ressentiram por todos os seus esforços para ocupar o lugar de seu pai dignamente? Tremendo problema.

– Você me ouviu?

Ele finalmente deu total atenção à tia-avó Jean, que sempre cedera à vontade de abrir todas as portas fechadas que encontrava. Ele teve de sorrir quando flagrou seu chapéu vermelho e casaco chamativo cheio de lantejoulas. Envelhecer graciosamente nunca passara pela cabeça de sua tia. Muito menos guardar suas opiniões para si.

– Ouvi – respondeu ele.

– Bem, você sabe qual é?

O que ele não sabia era por que ela estava perguntando. Porque ela não queria uma resposta. Perguntas retóricas como aquela sempre davam abertura à saraivada de investidas “que não são da sua conta” à vida particular de todo mundo por parte da senhorinha.

Ele se recostou na cadeira.

– Seja o que for, tenho certeza de que você está prestes a me dizer.

– Insolente – censurou ela fechando a porta. – Você está entediado.

Sério mesmo?

– Você tem 29 anos e está sufocando. Há dois anos não tinha uma folguinha, um tempinho para respirar.

Ele permaneceu quieto, em silêncio. Cauteloso. Porque até agora sua tia-avó dogmática e excêntrica estava totalmente, cem por cento correta.

Sufocante. Essa era uma boa palavra para descrever sua vida atual. Um adjetivo adequado para a sensação frequente de que um peso insuportável havia pousado em seu peito e o estava segurando no lugar, incapaz de se mexer.

Conforme tia Jean dissera, seu tempinho para respirar tinha sido roubado, seu ímpeto, detido. Todo pensamento fervoroso estava congelado, atrelado ao momento em que uma estrada escorregadia e uma curva sem visibilidade mudaram tudo que ele e sua família conheciam sobre suas vidas anteriores.

– Você precisa de um pouco de emoção. Uma aventura. Há quanto tempo não faz sexo?

Joe tossiu com a mão em concha o ar que havia acabado de inspirar e que se alojara em sua garganta.

– Tia Jean…

Ela resmungou:

– Ah, por favor, poupe-me. Você precisa transar.

– Nossa, você não pode assar bolos, tricotar ou fazer qualquer outra coisa, como uma tia-avó normal?

Ela o ignorou.

– Você transou desde que aquela estúpida da Tate tentou obrigá-lo a escolher entre ela e sua família? – Sem esperar por uma resposta, ela continuou: – Você precisa fazer algo além de lidar com sua mãe triste, suas irmãs briguentas e o delinquente juvenil do seu irmão.

Ele endureceu, a reação foi um reflexo.

– Ah, não fique indignado, você sabe que é verdade – rebateu ela. – Amo todos eles tanto quanto você, somos uma família. Mas até mesmo maçãs da mesma árvore ficam bichadas às vezes.

A mulher amava suas metáforas.

– Eis aqui como você pode resolver isso.

– Eu sabia que em algum momento você ia me dizer o que fazer.

Ela o ignorou.

– Você simplesmente deve arranjar uma aventura.

– Está bem, entendi. Uma aventura chegando – disse ele revirando os olhos deliberadamente. – Devo telefonar para o Disque-Loucura ou simplesmente visitar o site vamosficarpirados.com?

– Você não está tão velho a ponto de eu não poder dar uns cascudos.

Ele sorriu.

– Naquela vez em que você me deu uns cascudos, quando eu era criança, coloquei sapos na sua poncheira pouco antes de uma festa.

Um brilho de diversão iluminou os olhos dela.

– Então faça isso de novo.

Joe franziu a testa.

– Perdão?

– Seja louco. Faça algo divertido. Largue essa pose de empresário cauteloso e seja o rebelde durão que você já foi certa vez.

Rebelde durão? Ele? O sujeito recentemente eleito Empresário Jovem do Ano?

– Até parece…

Ele não sabia o que soava mais estranho: ele ser aquela pessoa, ou sua tia-avó idosa usando o termo rebelde durão. Daí, novamente, ela havia acabado de perguntar sobre a última vez que ele tinha transado, uma pergunta que Joe não queria nem contemplar na própria mente.

Ela o encarou.

– Não pense que me esqueci de quem precisei salvar da prisão durante as férias da faculdade. E do sujeito que acabou levando duas meninas para o baile de formatura. Ou que contratou uma stripper para aparecer na casa do diretor do colégio.

Ah, aquele rebelde durão. Joe tinha esquecido tudo a respeito dele.

– O mundo já foi seu parque de diversões. Vá brincar nele novamente.

Brincar? Ser livre, isento de responsabilidades?

Joe olhou para os arquivos em sua mesa. Havia uma montanha de formulários de compras, requerimentos, folhas de pagamento, cópia de anúncios publicitários, documentos jurídicos… Tudo necessitando da atenção dele. Da assinatura dele. Do tempo dele.

E também havia sua agenda pessoal, repleta de obrigações familiares: consertar o carro da irmã, conversar com o treinador do irmão… cumprir funções paternas das quais não imaginara que fosse se encarregar por pelo menos mais uma década.

Tudo era responsabilidade dele. Não em uma década. Agora.

Não era a vida que ele tinha imaginado para si. Mas era a vida que ele tinha. E não havia nada que ele pudesse fazer a respeito.

– Esqueci-me de como se faz isso – murmurou ele.

Ela ficou calada por um longo instante, e então a senhora, cujo nível de energia contradizia sua idade, riu baixinho. Havia certo tom naquela risada, tanto dissimulado quando sorrateiro.

– O que quer que você esteja pensando em fazer, esqueça.

Ela fingiu um olhar de mágoa.

– Eu? O que eu poderia fazer?

Ele era esperto para ser enganado pelo discurso de senhora-boazinha. Ela usava desse subterfúgio desde sempre, e tinha sido a ruína de muitos dos membros mais ingênuos da família.

– Vou deixar um bilhete avisando que se eu for sequestrado por uma trupe de palhaços de circo, a polícia deverá falar com você.

Ela fez um “tsc”.

– Ah, meu garoto, palhaços de circo? Isso é o melhor que você consegue inventar? Estou magoada… você me subestimou.

– Tia Jean…

Ignorando-o, ela se virou em direção à porta. Antes de sair, no entanto, olhou para trás.

– Eu tenho a maior confiança em você, querido. Não tenho dúvidas de que, quando o momento certo se apresentar, você vai aceitar o desafio.

Soprando um beijinho breve e tilintando as pulseiras caras que decoravam seu braço magro, ela saiu. Joe estava livre para voltar ao trabalho. Mas, em vez disso, passou alguns minutos pensando no que sua tia-avó Jean dissera.

Não tinha dúvidas de que ela estava certa sobre o fato de ele estar entediado. Reprimido. Sufocado. Mas sua solução de pirar um pouquinho não era a resposta. Não para a vida que ele estava vivendo agora. Não quando tanta gente contava com ele. Sua família. Seus funcionários. Seu falecido pai.

Além disso, não fazia diferença. Nenhuma oportunidade para brincar, conforme ela dissera, se apresentava para ele há muito tempo. Há mais de dois anos. A palavra nem mesmo fazia mais parte de seu vocabulário.

E, francamente, Joe não via possibilidade de aquilo mudar tão cedo.

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Hey gente, fic nova no ar. Se tiver bastante comentário faço maratona.
Pra quem perguntou de "A Sexóloga", ela está parada no momento.
xoxo

7 comentários:

  1. parece mt boa essa
    ansiosa.....
    saudades de A Sexóloga ......
    Posta Logo!!

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  2. Adorei!!! Pelo jeito vai bombar!!! Amo maratona.... continua por favor!!!!

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  3. Woow ja gostei pelo jeito essa vai ser bem legal, posta mais

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  4. Já gostei dessa história, pelo jeito mais uma história linda e fantástica vai sair da sua cabeça... Muitos parabéns mais uma vez, suas histórias são lindas

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