23.10.15

Minha Dupla Vida - Capitulo 5


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NA MANHÃ seguinte, Joe cruzava o terreno da vila em estilo espanhol onde havia passado a infância, pelo menos sempre que um de seus pais não o carregava para Europa ou Nova York quando viajavam a trabalho. Ele tinha uma pergunta para seu pai, então foi à fonte. Não que estivesse ansioso para o encontro.

– O que diabos você está fazendo aqui? – O pai de Joe o cumprimentou diante do cômodo convertido em estúdio artístico nos fundos da vasta propriedade na praia de Malibu.

Um homem grande e robusto na casa dos 70 anos, Thomas Fraser II tinha barba grisalha e cabelo branco desgrenhado e espesso que se arrepiava para todas as direções. Atrás dele, esculturas em argila e mármore em várias fases de criação se amontoavam no piso de ladrilhos. Além de ser um famoso produtor, o sujeito era escultor no tempo livre. Pessoalmente, Joe sempre achara que seu pai tivesse transtorno de hiperatividade e déficit de atenção, pois nunca conseguia ficar parado por mais de um minuto e sempre precisava de algo novo para prender a atenção. Ele era um gênio criativo em muitos sentidos, mas sua capacidade de acompanhar as coisas era terrível. Quando iniciaram o negócio juntos, Joe tivera esperanças de que seus estilos opostos pudessem equilibrar um ao outro. No entanto, esquecera-se do fato de que Thomas também gostava de fazer as coisas do seu jeito o tempo todo.

– Olá para você, também. – Joe passou pelo pai rumo ao piso térreo ao ar livre do estúdio, onde um longo painel de janelas estava aberto para permitir a entrada da brisa do oceano Pacífico. Quando Joe era criança, o estúdio era a piscina da casa. – E acredite, não estaria aqui se achasse que você poderia me dar uma resposta direta pelo telefone.

Era melhor ver a cara do pai pessoalmente. Assim Joe poderia distinguir a realidade da ficção quando questionasse sobre sua empreitada mais recente. Joe não teria arriscado um confronto caso não necessitasse da verdade. A pesquisa de Demi havia lhe dado muito em que pensar.

– Bah – resmungou Thomas, virando as costas para Joe a fim de lavar as mãos em uma pia encostada na parede. – Como se você tivesse direito a respostas diretas. Que direito você tem de me questionar sobre meus negócios, afinal?

– Quem disse que vim com interesse profissional, pai?

Joe passou a mão ao longo das curvas graciosas de um cavalo de mármore inacabado. A peça era uma das favoritas de Joe, originalmente concebida como uma homenagem a sua mãe, mas tal noção romântica foi anulada quando Thomas a flagrou com outra pessoa. A mãe atriz de Joe não passara muito tempo com os três filhos quando eles eram jovens, porém ela os levava para o interior da Toscana em todos os verões para ficar com os avós maternos, uma pausa bem-vinda de seu pai egocêntrico. Damian e Lucien, seus irmãos mais novos, saíram da região de Los Angeles logo que completaram 18 anos, prontos para colocar algum espaço entre eles e o pai autoritário.

– Desde quando você tem alguma preocupação que não seja trabalho? – Thomas pegou uma toalha de linho em uma estante e lançou um olhar penetrante enquanto secava as mãos.

Joe caminhou até uma escultura do torso de uma mulher, seios empinados e tesos bem na altura dos olhos do espectador graças a um pedestal. A coluna arqueada e os quadris largos o fizeram pensar em Demi.

E em Natalie.

– Desde que aprendi que preciso ficar duas vezes mais alerta quando faço negócios com a família.

– Bobagem. – Thomas fez um gesto de desprezo. – Seu problema é que você ainda não teve vida pessoal desde Heather. É por isso que você é muito intenso. Um homem precisa de uma mulher.

Joe se recusava a discutir seu envolvimento romântico com a única mulher por quem ele se apaixonara de verdade. Uma mulher mais atraída pela ideia de ser casada com um Fraser do que pela realidade de amar Joe.

Thomas podia ser um pé no saco, mas tinha magnetismo pessoal de sobra. O velho possuía uma competência e tanto, e Joe às vezes desejava não estar na mesma arena que seu pai.

– Você certamente não se privou de mulheres – observou Joe sutilmente, ansioso para desviar o assunto.

Ignorando o comentário, Thomas foi até um balcão do outro lado da sala e pegou uma garrafa pesada de cristal.

– Bebida? – perguntou ele, enchendo um copo com um líquido âmbar.

Como era o pai de Joe, não havia como saber se aquele era o melhor uísque escocês ou uma nova receita vinho de dente-de-leão preparada na mesma maldita pia onde ele lavava as ferramentas de talhagem. Seu pai gostava de pensar em si como um homem renascentista, mas suas habilidades como vinicultor eram rudimentares, na melhor das hipóteses.

– Não. – Joe foi até uma cadeira alta perto de uma mesa de bar no meio do cômodo e sentou-se. – Esta não é uma visita social.

Ele precisava ver a expressão do pai quando lhe perguntasse sobre os direitos do filme que tinha adquirido para produzir uma história suspeitosamente semelhante àquela que Joe tinha tentado fazer enquanto trabalhava para a empresa de Thomas. Ele precisava entender as intenções do sujeito. Claro, Thomas sempre fora ridiculamente competitivo, especialmente com Joe. Mas será que ele realmente faria um filme apenas para ofender o filho? Joe sentia como se houvesse algo faltando e tinha esperanças de que aquele momento cara a cara fosse ajudá-lo a descobrir por que o pai mudara para um novo nível de agressão na guerra familiar corrente pela fama de Hollywood.

Será que Thomas não via que era a vez de Joe de obter reconhecimento? Que era a vez de Joe brilhar?

– Notei que você não tem sido muito sociável desde que acabei com a produção do seu último filme. – Thomas caminhou pelo estúdio, bebida na mão, olhos itinerantes sobre suas criações. Ele fez algumas pausas para escovar o pó de pedra de uma escultura, ou para traçar um sulco ao longo de um modelo de argila.

Lutando para não perder a paciência, Joe lembrou a si que estava ali para obter respostas e que não podia deixar seu pai distraí-lo, usando a relação pessoal distorcida que tinham. Foi assim que Joe conseguiu se juntar à empresa cinematográfica do pai, para começar: empregando mal o sentimentalismo e a esperança de que poderiam trabalhar juntos como adultos, mesmo depois de uma relação conflituosa durante a juventude de Joe. Péssima ideia.

– Com um bom motivo. – Joe pegou seu telefone celular e rolou pela tela buscando notícias na área da cultura. – Mas acho que você me deve uma explicação caso vá produzir o filme que não me deixou fazer. – Ele leu em voz alta: – “A Fraser Films comprou os direitos de Quiet Places, um livro sobre a guerra do Vietnã que relata a amizade improvável entre prisioneiros de guerra americanos.”

– E daí? – Thomas bebericou um gole demorado, sem nem mesmo olhar para Joe.

– Tenho um roteiro fantástico e angustiante sobre prisioneiros de guerra durante a guerra da Coreia. Você sabe disso.

– O seu envolve presos de guerra australianos. Meu projeto tem mais da coisa americana.

– Certo. Bem lembrado. – Joe desligou o celular e se levantou. Tinha conseguido o suficiente da resposta de que necessitava. Thomas não estava comprometido com o filme tanto quanto estava comprometido em irritar Joe. Mas isso não significava que ele não faria o filme. Porém, até agora, a história não o empolgara artisticamente falando. – Vou deixar você voltar ao trabalho.

Thomas ficou calado. Joe estava quase na porta quando o ouviu pigarrear. Agitar os cubos de gelo no copo.

– Ouvi dizer que você andou saindo tarde da noite pela cidade – falou Thomas casualmente, como se fosse uma simples observação.

Joe se virou. Precisava dar o fora da casa de seu velho pai, mas ficou aguardando pelo golpe inevitável. Sem dúvida Thomas tinha um motivo para comentar a única noite da qual Joe desfrutara em muito tempo.

– Decepcionado porque não convidei você? – Ele manteve o tom leve, mas a tensão havia tomado seus ombros.

– Estou preocupado, Joe. – Ele colocou o copo vazio na mesa antes de pegar uma pequena picareta e se aproximar de uma figura de barro com a cara de um leão. – Você tem alguns clientes menores de idade nessa sua agência nova. Não tenho certeza se essa coisa transmite uma boa mensagem para os pais de jovens atrizes cujo empresário está apadrinhando clientes em boates.

– Eu ficaria surpreso se alguém pensasse qualquer coisa a respeito disso. – Los Angeles não era nenhuma cidadezinha do interior onde um agente poderia ser visto como um personagem decadente.

– Confie em mim. Basta apenas um artigo bem posicionado para transformar isso em um escândalo. – Ele levou a picareta às linhas de argila ao redor da cara da nobre criatura. – Você odiaria perder seus jovens clientes. Eles são o futuro de qualquer agência boa.

– E corta! – Joe usou as mãos para imitar o movimento de uma claquete. – Bela tomada, pai. Pena que as câmeras não estavam rodando.

– Estou tentando ajudar você, Joe – argumentou o outro. – Só o pressiono para que você possa alcançar mais sucesso. Você não vê? É o papel de um pai.

Joe não conseguia pensar em muitos pais que levassem tal papel tão a sério, mas não ia cair nesse assunto outra vez. Já havia descoberto o que precisava saber.

– Tudo bem, papai. Obrigado. – Balançando a cabeça, saiu do estúdio e cruzou o gramado até seu carro, incomodado por ter dirigido por toda a Pacific Coast Highway só para ser recebido com mais joguinhos.

Pelo menos tinha descoberto o movimento seguinte do pai. Thomas ainda estava tentando manipular Joe como uma peça de xadrez, em um jogo que o filho nunca desejara jogar.

Ainda bem que o próximo item em sua agenda era o almoço com Demi Masterson. A analista aparentemente tímida se mostrara cheia de todos os tipos de surpresas interessantes na última vez que se encontraram.

Nas últimas 24 horas, Joe vinha pensando muito nela. Aquela plumagem branca sobre a mesa tinha estimulado sua imaginação, fazendo-o se perguntar como ela passava o tempo fora do escritório. Era uma ideia maluca achar que Demi tinha algo a ver com Natalie Night. Mas a foto dela no estúdio de dança definitivamente impulsionara tal pensamento.

A probabilidade era a de que Demi só tinha ido ao estúdio para uma festa de despedida de solteira. O Naughty by Night normalmente anunciava eventos como esse nos meios de comunicação locais. No entanto, Demi compartilhava algumas características-chave com Natalie, incluindo a rara capacidade de deixar Joe enlouquecido apenas com um olhar. Assim, muito embora uma conexão entre as mulheres fosse altamente improvável, as fantasias de Joe estavam sendo bem prazerosas diante de tal ideia.

Além disso, retornar ao Backstage seria perigoso para ele, caso houvesse alguma chance de seu pai agir de forma tão baixa, tentando, por exemplo, minar a reputação do filho. Para permanecer seguro, Joe iria manter suas fantasias para si. Ou, melhor ainda, iria mantê-las entre ele e Demi.

PEGUEI O telefone dez vezes para cancelar o encontro. Quer dizer, almoço de negócios. Dez vezes.

Mas quando ouvi a recepcionista, Star, com seus saltinhos estalando no final do corredor, ainda não tinha dado o telefonema que iria dar fim àquela loucura. Agora não havia como recuar.

– Demi? – Star bateu de leve na porta aberta, seu cabelo ruivo preso para cima como o de uma professora de outras eras.

Havia algo de muito apropriado naquele penteado retrô e na xícara de chá de porcelana de Star, a qual ela carregava pelo escritório durante todo o expediente. Mas as aparências enganavam, porque ela era a mesma colega que escolhera fazer sua despedida de solteira na Naughty by Night. Eu queria agradecê-la – ou culpá-la – por ter me transformando em atração principal no clube de cavalheiros locais.

– Sim? – Fiquei de pé, pronta para fugir do meu escritório, a fim de escapar daquele almoço, mesmo tendo eliminado qualquer prova incriminatória da minha aventura no Backstage. Ou mesmo da minha dança.

– Pendleton queria que lhe entregasse isto. – Ela me deu uma pasta gorda que pertencia ao chefe. O arquivo tinha o nome de uma conhecida empresa do Vale do Silício na aba.

– Uma conta nova sobre a qual devo pesquisar? – Peguei a pasta e a coloquei sobre minha mesa, ao mesmo tempo percebendo que estava extremamente decepcionada pela recepcionista não estar ali para anunciar a chegada de Joe.

– Tem mais. – Star sorriu e meneou as sobrancelhas. – Ele me pediu para lhe dizer que realmente gostaria que você cogitasse assumir a liderança dessa conta.

– Eu? – Meus batimentos cardíacos vacilaram um pouco. – Ele sabe que sou uma pessoa de bastidores.

Pendleton estivera na minha entrevista com a empresa. Ele sabia melhor do que a maioria das pessoas o quanto minhas habilidades para falar em público podiam ser terríveis. Ainda assim, ter contato com clientes poderia aumentar meu salário, se um dia me sentisse pronta para enfrentá-los.

– Talvez ele tenha percebido que você não é mais tão tímida quanto costumava ser. – Star endireitou o camafeu do colar vintage que usava. – E, a propósito, Joe Fraser está aguardando por você lá na recepção.

Um grito alarmado nada nobre me escapou.

– Por que você não disse logo? – sibilei para ela, agarrando minha bolsa e verificando meus dentes em um espelho enfiado em uma estante.

– É divertido surpreender você – admitiu ela, me acompanhando enquanto eu acelerava pelo corredor.

– Assim você pode me ver tropeçar e talvez até gaguejar? – Todo mundo no escritório já havia presenciado a falha no meu discurso em algum momento. Mas tinha de admitir: todos eram muito tranquilos em relação a isso. E, exceto por algum estagiário temporário sem noção, todo mundo era muito paciente comigo quando me enrolava com as palavras.

Era humilhante ter gente tentando concluir minhas frases.

– Não. – De trás de mim, Star enfiou a etiqueta da minha camisa para dentro da gola. – Porque você é muito mais animada do que a maioria das pessoas da equipe.

– Eis um jeito novo de enxergar a situação – resmunguei, mesmo percebendo o que ela queria dizer. Havia algumas pessoas na contabilidade que você poderia jurar serem desprovidas de um coração.

– Vá pegá-lo, Demi – sussurrou Star ao meu ouvido assim que abri a porta para a recepção. – E não se preocupe se você não voltar depois do almoço. Sempre posso dar-lhe cobertura.

As palavras soaram em meus ouvidos quando captei a primeira visão de Joe. Uma visão maravilhosa, de tirar o fôlego. Ainda não podia acreditar que havia tido uma chance com ele na outra noite. E realmente não conseguia acreditar que o ignorei e fui para casa.

Precisava parar de deixar as velhas inseguranças arruinarem minha vida.

– Oi – falei, sem jeito, parando no meio do saguão.

Animada? Eu não conseguia pensar em uma única palavra para dizer ao sujeito. Ele usava calça jeans e uma camiseta vermelha desbotada, mas seus sapatos eram de matar. Mocassins velhos de couro, uma mistura de gigolô italiano com caubói americano. Ele estava muito gostoso.

– Você está pronta? – Joe sorriu, e me perguntei o que ele tinha em mente para o almoço.

Provavelmente nada parecido com a diversão que eu estava imaginando agora. Além disso, estava vestida com uma saia cáqui entediante na altura dos joelhos e uma camiseta branca comprada no departamento de roupas masculinas. Eu sempre achava que, com a bijuteria certa, a camisa masculina poderia se afirmar como uma coisa na moda. Embora a afirmação que eu estivesse fazendo agora provavelmente fosse algo como Desisto!, acho que me esforcei demais para não me vestir para a sedução, já que isso era tudo que eu tinha em mente.

E independentemente das fantasias que tivera com Joe, o relacionamento com clientes estava fora dos limites.

– Espero que sim. – Enfiei meu tablet na bolsa e mais algumas anotações que havia preparado para ajudá-lo com segurança on-line. – Isto é, sim.

Tardiamente, lembrei-me de ser mais firme. Direta. Se queria me sair bem falando em público, precisava me articular melhor.

– Ótimo. – Ele olhou para meus pés e me lembrei de que estava usando tênis de lona. – São perfeitos para o que tenho em mente.

Fiquei aliviada, já que tinha toda a intenção de trazer um par de saltos altos para o trabalho hoje, especificamente para este almoço. Mas minha mãe havia telefonado pouco antes de eu sair, me perturbando com sua enxurrada mensal de perguntas sobre o que eu planejava fazer com a minha vida. Ela ainda não me oferecia reconhecimento em público, afinal eu continuava a envergonhá-la em seu mundinho perfeito, mas ela não desistira de sua busca para me moldar, a fim de eu virar um ser humano melhor. Ela ainda me inscrevia em aulas de dicção, às quais eu não comparecia, e em oficinas destinadas a me ajudar a aprender como me vestir com mais discernimento.

Hum. Não, obrigada, mãe.

– É mesmo? – Passei pela porta do escritório rumo ao calor do meio-dia. Havia algumas nuvens ameaçadoras, mas por enquanto o dia estava apenas úmido e quente. – Vamos comer em um desses trailers de rua? Tem um cara grego no próximo quarteirão que vende gyros… – fiquei muito arrebatada pelas minhas lembranças culinárias para descrever o sabor – incríveis.

– Não. – Joe me guiou em meio a um punhado de empresários vestindo terno que andavam lado a lado, todos falando em seus celulares. – Meu carro está desse lado aqui.

A mão de Joe em meu cóccix foi fugaz, porém sexy. Minha pele se arrepiou naquele ponto, mesmo depois que ele se afastou.

– Agora estou curiosa. – A respeito de Joe, percebi. Imediatamente fiquei tensa. – Quer dizer, sobre para onde estamos indo.

– Você gosta de surpresas?

– Na verdade, sim. – Vi um Jaguar preto rebaixado na rua e supus ser o carro dele. – Você pode achar que uma menina tímida e quieta como eu não seja fã de surpresas, mas quando nasci meus pais já eram mais velhos e nunca faziam nada sem grandes planejamentos.

Joe pôs a mão em minhas costas de novo e me guiou por uma esquina, até uma rua lateral. Acabou que o Jaguar não era dele. Captei o menor indício do perfume dele e desejei poder chegar mais pertinho.

– Tímida? – perguntou ele, inclinando a cabeça para olhar meu rosto. – Eu nunca teria considerado você tímida.

Ai, meu Deus. Algo no tom de voz de Joe me fez pensar que ele sabia meu segredo. Ele sabia que eu era a dançarina no Backstage. Meu coração acelerou descontroladamente e meus pés se embaralharam um pouco.

Joe segurou meu braço, exibindo um sorriso divertido.

– Meu carro está aqui. – Ele apontou para um enorme utilitário branco.

– Nunca achei que você fosse do tipo que teria um utilitário. – Fiquei feliz por redirecionar a conversa, já que não tinha ideia do que dizer sobre sua afirmação de que eu não era tímida. Todo mundo me considerava tímida… bem, pelo menos as pessoas que não me conheciam.

– Então acho que já estamos surpreendendo um ao outro – observou ele sutilmente, abrindo a porta do passageiro para mim e me ajudando a subir na cabina.

Ele deu a volta para o lado do motorista e entrou. Afivelamos os cintos e saímos calmamente em meio ao tráfego de horário de almoço, mesmo com tudo estando uma loucura.

– Então você gosta de dirigir um tanque? – Usei o retrovisor lateral para me certificar de que ele não estava esmagando os carros menores na pista ao lado, quando seguiu para a direita. – Eu ficaria uma pilha de nervos nessa coisa.

Eu estava uma pilha de nervos, de qualquer forma, ali a sós com Joe em um espaço fechado. Uma vida inteira de comentários mordazes da minha mãe voltou para me assombrar enquanto me perguntava se minha roupa estava combinando e se conseguiria enfrentar o almoço sem tropeçar nas palavras. Para me distrair dos pensamentos negativos, tentei me concentrar no veículo e me perguntei se ele estava dirigindo a caminhonete na outra noite, no Backstage. Parecia muito espaçosa.

Poderíamos ter realmente… nos divertido.

Precisei me abanar para evitar o superaquecimento enquanto imaginava as mãos dele em cima de mim.

– É um veículo de trabalho – assegurou ele, seguindo para a parte oeste na Sunset Boulevard. – Trabalhar para mim significa pegar no pesado. Às vezes preciso transportar material por aí.

Ou convidar dançarinas exóticas para seu banco de trás? Olhei furtivamente para as coxas dele e me imaginei montando nelas.

– Você é um agente de talentos. – Abaixei o vidro do lado passageiro e deixei um pouco da brisa entrar para ajudar a me refrescar. Era divertido estar num carro tão alto. E nunca me cansava do oceano. Eu morava perto dele, mas não via o suficiente.

– Como você pega no pesado enquanto conversa com agentes de elenco e envia fotos?

Aquilo o fez rir, e gostei do som, enquanto deixávamos o centro de Los Angeles para trás. Ele parecia demasiadamente sério para um sujeito nascido na realeza de Hollywood. Eu sabia que o dinheiro não trazia felicidade, mas, na maioria das vezes, ajudava.

– Você, de todas as pessoas, deve entender que tenho aspirações maiores do que gerir minha lista de clientes. – Passamos por um turista que tietava um casal de estrelas de reality show em uma faixa de pedestres, os braços cheios de sacolas de compras. – Então trabalho muito mais horas no dia além do que meus negócios exigem. Mas este carro se provou útil até mesmo para a agência de talentos. Há um ator famoso que assinou comigo, e ele não vai a lugar nenhum sem seu cachorro são bernardo. Buddy nunca caberia em um carro esportivo.

– Tenho muita curiosidade sobre o desenvolvimento da sua empresa de cinema. – Estudei o perfil dele para ver se tinha me aventurado em um assunto proibido. – Adoraria saber mais sobre isso, se você não se importar.

– Depende. Você está pedindo para si ou como representante da Sphere?

– Definitivamente para mim. Mas eu não queria…

– Tudo bem. – Ele abriu o teto solar e olhei para cima; vi as palmeiras e o céu cheio de nuvens. – Aprendi a ser cauteloso, mas que mal faria comentar com alguém que já conhece o plano?

Os quilômetros voavam conforme ele me contava sobre algumas noções básicas do ramo. Sabia uma coisa ou outra sobre empresas start-up, mas nada sobre o nascimento de um estúdio de cinema, então aprendi muito. Logo se tornou óbvio que Joe sabia o que estava fazendo. Também me ocorreu que seu pai era um tolo por permitir que um sujeito bem informado sobre o ramo como Joe escapasse.

Quando o utilitário tomou uma estrada íngreme e sinuosa em Pacific Palisades, quase tinha me esquecido do nosso almoço. Ops, reunião.

– Onde estamos? – Olhei as redondezas com mais atenção e tive certeza de que nunca havia estado ali. Parecia um lugar improvável para um restaurante.

– No local de nosso piquenique.

– V-v-vamos fazer um piquenique? – Hesitei nas palavras porque um piquenique fazia aquilo se parecer muito mais com um encontro de namorados do que com uma reunião. E de repente senti mais pressão. Cuidado.

– Percebi ontem que fiquei ralando por meses para recuperar alguma credibilidade profissional, mas não importa o quanto eu trabalhe, meu pai ainda vai estar esperando que eu cometa um erro. – Ele parou em um estacionamento perto de um campo gramado com um cartaz que dizia “Will Rogers State Park”. – Achei que era melhor encontrar tempo para desfrutar dessa jornada, porque tenho certeza de que não estou nem perto do ponto da minha vida em que poderei escapar da sombra do velho.

Ele desligou o motor e deu a volta para abrir a minha porta. Eu estava começando a ficar tensa, o ambiente descontraído do passeio dissipando sob a pressão de… ajudar Joe Fraser a aproveitar sua jornada. Mas ele parecia inconsciente da minha mudança de humor quando se dirigiu para a parte traseira do veículo e abriu o porta-malas.

– Pronta? – perguntou ele, me entregando um cobertor azul enquanto pegava uma imensa bolsa térmica. – Espero que não chova.

– Uau. – Eu não conseguia pensar em mais nada a dizer porque meu cérebro estava ocupado calculando o tempo e o esforço que ele deve ter depositado no planejamento daquilo tudo. Arrumar as coisas de um piquenique me pareceu incrivelmente romântico, embora soubesse que essa não era a intenção dele. No entanto… e se fosse?

Voltei a me preocupar se ele sabia que era eu no palco do Backstage. Afinal, eu era capaz de acreditar que Natalie Night o havia encantado. Mas eu? Demi? Diabo, eu era uma contadora, e até mesmo eu não era capaz de fazer aquela conta dar certo.

– O quê? – Ele olhou para mim quando passamos por um campo de polo vazio, em direção a algumas mesas de piquenique desertas. – Você é contra piqueniques? Tem fobia de formigas, talvez?

– Não. – Segui-o até a mesa de piquenique à sombra de uma árvore imensa, onde paramos. – Só estou surpresa por estarmos fazendo um piquenique em uma reunião de negócios.

– Primeiro de tudo, você disse que gostava de surpresas. – Ele pegou o cobertor das minhas mãos e o estendeu à sombra, com cuidado para evitar as raízes das árvores. – Em segundo lugar, só joguei a parte sobre trabalho para me certificar de que você viria.

Seus olhos encontraram os meus, e a voz dele baixou para aquele tom de intimidade tranquila.

– Oh. – Aparentemente, ele tinha planejado tudo. Meu coração batia tão rápido que me senti um pouco tonta. Dizia a mim mesma para falar devagar. Realmente devagar. Porque fiquei tão desnorteada, que estava com o corpo tombando. – Por quê?

Isto é, por que é importante eu estar aqui?

Aquela era a chance de ele denunciar minha dupla identidade. Ele poderia acabar com a tensão agora e me confrontar sobre a duplicidade. Parte de mim achava que seria melhor simplesmente admiti-la. Eu sempre poderia me subjugar a ele e pedir para não contar ao meu chefe.

Na verdade, me subjugar a ele não parecia nada mal.

– Quero saber mais sobre você, Demi Masterson. – A expressão de Joe não revelava nada.

Ainda assim, minha pele formigava em todos os pontos, como se ele tivesse acabado de me tocar.

– De um jeito pessoal? – Passei os braços em volta do corpo, apesar do calor do dia, porque estava arrepiada em todos os lugares.

– Acho que você sabe a resposta para isso. – Ele apontou para o cobertor. – Sente-se.

Escolhi um canto mais perto do tronco da árvore e tentei não hiperventilar. Por alguns minutos, vi-o abrindo a bolsa de piquenique em silêncio. Pegou uma garrafa de um champanhe excelente e duas taças de cristal. Fui encarregada de servir a bebida enquanto ele pegava queijos, frutas e algumas minibaguetes. Ele também havia trazido salmão conservado no gelo e alguns chocolates.

Enquanto me atrapalhava com a embalagem de alumínio e colocava um guardanapo de linho ao redor da cortiça para tirar a rolha, assisti a Joe trabalhar na apresentação da refeição. Gostei de ele ter me deixado processar toda a coisa do “Quero te conhecer no âmbito pessoal” no meu próprio ritmo.

– Você está colocando o Claude Troigros no chinelo. – Eu o observava cortar um morango em fatias para decorar o prato de frutas.

– Resolvi usar todos os recursos existentes para seduzir os sentidos. – Ele estendeu uma fatia de morango para mim. – Gostaria de uma mordida?

Meu coração parou. Perguntei-me vagamente quanto tempo ainda conseguiria respirar sem esse órgão vital funcionando, mas depois ele voltou a engrenar. Agora batia num ritmo que parecia três vezes mais rápido. Aquilo realmente estava acontecendo. Eu poderia perder meu emprego por isso.

Mas estava muito longe do escritório agora.

Envergonhada, abri os lábios e me inclinei para a frente. Os olhos de Joe mergulharam em direção à minha boca enquanto ele me alimentava, os nós dos dedos roçando em meu queixo, e então a mão caindo.

– Delícia. – Ele nem sequer tinha provado o morango. Simplesmente estava concentrado em meus lábios.

Eu estava completamente perturbada. Totalmente excitada, mas desconcertada também.

– Você não precisava t-t-ter tido todo este trabalho – falei a ele, desacostumada àquele tipo de atenção masculina.

– Não? – Ele pegou a garrafa de champanhe das minhas mãos e finalizou o trabalho do qual tinha me esquecido. A cortiça estalou suavemente quando saiu. – Acho que você está errada. Da última vez que a convidei para sair, levei um bolo.

Ele serviu o champanhe tão calmamente, que ninguém que estivesse nos observando teria imaginado que ele havia acabado de jogar uma granada no meu mundo.

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MEU DEUS, O QUE VEM POR AI?
xoxo

5 comentários:

  1. Hum será que ele descobriu isto perante a reacção dela durante a conversa (porque ele no início do capítulo ainda tem dúvidas) ou será que ele atirou apenas para o ar a ver se acertava???
    Estou curiosa para descobrir isto e para ver como a Demi vai reagir e como o piquenique vai correr :)
    Posta mais :)

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  2. Pq vc parou justo agoraaaa....posta outro hj por favor.... acho que ter um ataque cardíaco aqui se não souber qual vai ser a reação dela..... será que ele foi atras de informações sobre ela? Acho que a foto ajudou ele a descobrir .... continua logo por favor!!!

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  3. caraamba pq parou ai???
    posta mais antes que eu tenha um ataque cardíaco!!!!

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  4. PORRA ELE DESCOBRIU. Como tu pode parar ai menina meu Deus preciso de mais eu to surtando aqui pra saber o resto se eu infartar saiba e a culpa é tua kkkkkk
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  5. Puta merda,puta merda,puta merda, agora o bagulho ficou doidoooo, eu acho que agora que ela vai relaxar e ser ela mesmo sem essa gagueira.

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